(Crítica) Napoleão - Uma história a duas frentes
É conhecido o fascínio de Ridley Scott por retratar com intensidade as personagens dos seus filmes, tornando-as inesquecíveis.
Recordemos por exemplo, o filme Thelma e Louise e o universo vigorante de Thelma (interpretação de Geena Davis) e de Susan Sarandon interpretando Louise.
Vinte e três anos depois de ter trabalhado com Joaquin Phoenix no Gladiador, o realizador britânico voltou a escolher o actor para interpretar Napoleão Bonaparte em mais um épico histórico, e mais uma vez, consegue criar uma personagem, que muito embora, segundo a História, não é das mais fidedignas, é marcada por um desempenho impetuoso.
Na verdade, o filme Napoleão, espelha mais momentos marcantes da vida de um militar, do que propriamente retratar uma época histórica indiscutivelmente importante tanto para França como para o resto da Europa da altura.
O filme não tem o pretensiosismo de mostrar um herói, mas seguramente surge ao espectador um Napoleão revigorado com características singulares. Se por um lado, temos a figura de um capitão que assiste à decapitação de Maria Antonieta, diga-se de passagem, uma das cenas de morte mais realistas e frias que pudemos ver em cinema (é como se ele próprio assistisse ao momento de viragem da sua própria vida naquela cena), por outro, percebemos que Phoenix, já habituado a papéis de perfis indeléveis (o mais recente Joker, por exemplo, e cujo o brilhante desempenho lhe deu o óscar para melhor actor em 2020), vive a personagem de um homem discreto, mas com habilidades estratégicas que lhe valem a vitória de várias guerras.
E o mais interessante neste filme, para além de vermos como Napoleão implementou essas estratégias no campo de guerra e que, já há muito não víamos num drama histórico de guerra, é assistir ao romance com o seu eterno amor, Josefina, com a excelente interpretação de Vanessa Kirby.
É vermos um Napoleão ambicioso e fragilizado, que cria empatia pelas pessoas, chega aos seus corações, que quer a paz no mundo às custas da guerra, mas que também sabe reconhecer quando a perde. E que, no entanto, conhece essa mulher que o desafia, de quem depende emocionalmente sem quaisquer regras que possa definir. Josefina é uma mulher decidida, de espírito livre, que procede à frente do seu tempo (esse simbolismo está presente no seu corte de cabelo, quase rapado, mostrando-nos que tem uma personalidade forte e resistente a conotações angelicais sem intensidade).
Ao mesmo tempo, temos duas histórias numa história, em que numa, as figuras centrais são Napoleão e Josefina vivendo um amor conturbado, e a história paralela da vontade incessante de Napoleão salvar a França para a Europa e conquistar o mundo.
E depois, a par uma da outra, a queda em ambas as frentes, de um amor que não pôde vingar e a derrota de Napoleão na batalha de Waterloo.
A banda sonora a cargo de Martin Phipps, que já conhecemos de bandas sonoras de séries como Peaky Blinders e The Crown ou de filmes como o The Aftermath, mais uma vez não desilude.
Napoleão é um filme a não perder, para quem gosta de Joaquin Phoenix e da figura marcante que foi Napoleão Bonaparte e não só.
Vamos ver agora quando este filme sair dos cinemas e chegar à plataforma da Apple TV+, se teremos oportunidade de assistir à versão Director’s Uncut, segundo se consta terá uma duração de aproximadamente 4h30m.