O crescendo do iPad

O dispositivo "no meio"

O iPad foi lançado no dia 3 de Abril de 2010 num evento especial da Apple. Steve Jobs estava já muito magro, a um ano e meio de nos deixar. Mas a sua determinação era imparável. Com a sua habitual descontração, gerou riso na plateia com uma citação do The Wall Street Journal:

A última vez que se assistiu a este nível de entusiasmo sobre uma tábua, ela tinha alguns Mandamentos lá escritos

Ainda com um ligeiro som de fundo em fade out das risadas, Jobs retomou o discurso recuperando o lançamento dos PowerBook em 1991 e dos iPhone em 2007, sublinhando a ideia de que a Apple inventou o computador portátil moderno e reinventou o telemóvel. Uma verdade inquestionável.

E, nesse ano de 2010, a premissa assumida pelo CEO da Apple foi a seguinte:

Hoje em dia, todos utilizamos um laptop e um smartphone. E coloca-se a pergunta: existe espaço para um dispositivo no meio? Uma coisa que esteja entre um smartphone e um laptop?

Para Steve Jobs, a criação uma nova categoria implicava o cumprimento parâmetros muito elevados. Qualquer que fosse esse novo dispositivo, ele teria que ser muito melhor que um computador portátil e que um smartphone em determinados pontos-chave, caso contrário não valeria a pena. E foram sete os que apresentou:

  1. Navegar na Internet;
  2. Acesso, consulta e gestão de e-mail;
  3. Ver e partilhar fotografias;
  4. Assistir a vídeos (pois... na altura o streaming ainda estava bem longe);
  5. Ouvir música (bom... aqui não sei bem, mas sim, em casa dá jeito);
  6. Jogar;
  7. Ler eBooks.

Com efeito, o melhor dos dois mundos confluía naquele iPhone grande, mas que não fazia chamadas. Ou naquele "computador portátil" com touchscreen que não tinha teclado nem rato.

Eu comprei um e confesso que não fiquei convencido. Também eu tinha um MacBook Pro e um iPhone. Mas aquele híbrido não me dava jeito porque nem o conseguia usar com processadores de texto ou folhas de cálculo, nem o tamanho era adequado para fazer as coisas que já estava habituado a fazer no iPhone.

Mas hoje... hoje as coisas são bem diferentes. Muito diferentes. Existe todo um ecossistema dedicado ao iPad. Hoje temos acessórios e software que concretizam de um modo bem claro a visão de Steve Jobs. Demonstração disso foi o rebranding feito pela Apple na Worldwide Developers Conference (WDC) em 24 de Setembro de 2019, o dia em que "nasceu" o iPad OS 13.

Até então, o sistema operativo (iOS) era partilhado com o iPhone, situação que simplesmente já era suficiente. Para cristalizar os tais pontos-chave que Jobs preconizou foi necessário separar as águas e apurar o tempero com os sábios ingredientes de Tim Cook: o Multitasking.

Tendo a adesão a este dispositivo sido explosiva nos seus seus primeiros anos de vida, mais importante ainda foi a sua estabilização, sintoma de que o iPad passou efetivamente a fazer parte do dia a dia dos consumidores.

E eis que surgiu a malograda Pandemia COVID-19. Ficar em casa, confinados, apáticos. Talvez por isso (mas não tenho dados que validem esta acepção) o número de unidades vendidas do iPad tenha aumentado fortemente durante 2020.

E talvez também porque as inovações que entretanto passou a ter lhe conferissem finalmente uma lógica de existência enquanto produto que cumpre um papel específico, ou seja, que habita por seu próprio mérito numa fatia de mercado que vale o investimento, para além de um laptop e de um smartphone.

Segundo o website Statista.com, no último trimeste de 2021 rendeu à Apple 7.4 biliões de Dólares, ou seja, aproximadamente 6.3 biliões de Euros, tendo sido vendidas, com base nos dados do website Business of Apps, 71,1 milhões de unidades por esse mundo fora durante 2020.  

A partir das duas fontes acima citadas, segue-se um quadro onde se pode ver a receita e o número de unidades vendidas e respetivas variações relativamente aos anos anteriores.

Ano Receita

(Biliões)

Variação Unidades vendidas

(Milhões)

Variação
2011 19,1 - 32,3 -
2012 30,9 62% 58,1 80%
2013 31,9 3% 97,0 67%
2014 30,2 -5% 67,9 -30%%
2015 23,2 -23% 53,8 -21%
2016 20,6 -12% 45,5 -15%
2017 19,2 -7%% -4% 96%
2018 18,6 -3% 43,5 0%
2019 21,2 14% 45,2 4%
2020 23,7 12% 71,1 57%

O dispositivo repleto de meios

Sim, cheio de meios para chegar a tantos fins. Antes de entrar neste ponto, vale muito a pena ver este flowchart criado por Martina Regli da Tamedia, publicado no website ecobookfriendly.com.

A "Arvore Genalógica" do iPad

Como se pode ver, em 2018, Tim Cook iniciou o processo de remoção dos Home Button nos iPad, o conferiu consistência aos modelos Pro criados no ano anterior. E estamos quase a chegar ao momento em que este botão se enquadre numa visão do passado em todos os segmentos deste dispositivo.

Com o surgimento de acessórios como o Magic e dos Smart Keyboard, o iPad assumiu um aspeto mais robusto e funcionalidade. No caso do Magic Keyboard, passa-se inclusivamente a ter um trackpad no teclado que quase o coloca no patamar de um laptop... mas nem tanto. Já na sua segunda versão, o Apple Pencil elevou a fasquia, abrindo portas para um brutal incremento no que respeita à interação com este dispositivo. Para além disso, os periféricos dos iMac (Magic Keyboard e Mouse) são também compatíveis.

Claro que continuamos a ter um produto ali no meio. É evidente que o MacOS Big Sur, e o seu sucessor Monterey, não são sequer comparáveis ao iPad OS15. Mas também não é esse o objetivo.

Nem mesmo a inclusão do recente processador M1 é comparável. Se bem que alcançando desempenhos estonteantes (mais uma clara vitória da Apple), não é a tanto a potência que conta. É o que fazes com ela. É teres um tablet com uma máquina fotográfica quase tão boa como a do teu iPhone, com sensor Lidar. Um tablet com ecrã Liquid Retina e com ligação Thunderbolt, mais tarde ou mais cedo, generalizada em todos os dispositivos da Apple.

Estamos portanto a falar de um aparelho que continua a balançar entre o laptop e o smartphone, parecendo uma coisa e parecendo outra, sendo claro que não é nenhuma das duas. É algo diferente. É, tal como Jobs o concebeu e Cook o desenvolveu, algo mais.

O dispositivo que criou o seu próprio meio

A conclusão é que o iPad é hoje em dia um dispositivo que tem um espaço próprio mais que justificado, que opera num ecossistema perfeitamente lógico e que interage sem falhas com o todo o ecossistema Apple.

O mundo iPad | Fonte: Apple

Por estes motivos não é "uma coisa no meio". É uma coisa com vida própria, de extrema utilidade, e com modelos suficientes para cobrir todas necessidades e adequar-se a todas as carteiras (sempre meio cheias porque não é barato, mas vocês percebem o que eu quero dizer).

Embora o novo iPad Mini 6 esteja prestes a ser lançado, em junho deste ano publicamos aqui no iFeed um artigo que compara todos os modelos do iPad à venda na Apple em 2021, que ilustra bem esta diversidade.

Concordas comigo? Quais as tuas opiniões sobre o iPad?