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Realidade Aumentada: vida facilitada ou uma nova dependência?
Gonçalo Antunes de Oliveira

Realidade Aumentada: vida facilitada ou uma nova dependência?

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Na habitual teia de rumores copiosamente difundidos pela Internet, parece que Tim Cook tenciona permanecer na Apple pelo menos até ao lançamento dos novos Apple Glasses. Tendo implementado com mestria novas categorias de consumíveis que extravazam os habituais computadores, tablets e telemóveis, Cook pretenderá criar uma linha de produtos dirigidos ao mercado da Realidade Aumentada / Virtual.

Muito se especula sobre o headset de Realidade Mista / Virtual, os Apple VR, e sobre o Apple Car. Mas parece que é nos óculos que se está a concentrar a atenção do CEO da Apple enquanto wearable que liderará as escolhas dos consumidores.

Apple View | Conceito de António de Rosa in Mac Rumors
Apple View | Conceito de António de Rosa in Mac Rumors

Já aqui falei em várias ocasiões que a Apple inova quer por trazer algo totalmente novo, quer por pegar no que já existe e fazer muito melhor. Ao contrário de outros, não decalca e vende igual, mas antes, pega no conceito ou na nova categoria e cria mais e muito melhor.

Em 2013, a Google começou a vender o protótipo dos Google Glass durante um período de tempo limitado pela módica quantia de 1.500 dólares. Quando tomei conhecimento da existência estes óculos procurei no YouTube e assisti ao anúncio. Fiquei extasiado. Aquilo era literalmente a concretização dos meus sonhos de miúdo, desenhados a partir da tonelada de filmes de Ficção Científica que preenchiam os meus tempos livres dessa altura.

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Pois: embora ainda rudimentar, já não se tratava de ficção. Extraordinário momento para se estar vivo! Passados uns quantos minutos dei por mim a pensar noutra coisa sem me aperceber. Era o outro lado da moeda. Aquela parte que os filmes não mostram.

Realidade Aumentada. Agora chamam-lhe assim. Ter tudo à mão deixará de ser uma expressão apropriada. Isto porque com o conjunto iPhone / Apple Watch e Apple Glasses, o tangível será cada vez menos importante. E um dia, estranha será a minha perceção da realidade tal como a experiencio e vejo agora.

Imaginem que um dia irão utilizar uns Apple Glasses (ou outros da concorrência) na mesma medida que um iPhone ou Apple Watch... mas há um dia em que não os usam por qualquer motivo.

O que será entrar numa estação de metro e não ver projetado no ar o horário da chegada da próxima carruagem?

Como será não ter setas no meio da rua que indicam o sítio para onde queremos ir, onde estará uma gigante bandeira de xadrez branco e negro que assinala o destino final?

De que modo conseguiremos entrar na Loja do Cidadão sem ter no canto superior direito do nosso campo de visão o número da senha e o tempo que falta para sermos atendidos?

Pois é! Imaginem o que seria a vossa vida sem um smartphone. No meu tempo, o telefone estava em casa e preso à parede e ao auscultador por fios! Bom, por essa ordem de ideias, imaginem o que seria a vossa vida sem auscultadores, sem tablets, sem computadores portáteis. Sem Internet, redes sociais e serviços de streaming...

Acredito que para muitos, sobretudo os leitores mais novos, esta realidade seja absolutamente inconcebível.

Há o antes e o depois. E quando o depois é o nosso presente, nesse momento já tecnologia moldou de tal modo o nosso quoditiano que o antes não passa de memorias difusas numa dimensão em que parece que nada fazia sentido por não termos o que existe hoje. Na verdade, é um processo de reescrita do passado.

O conceito de utilidade cria essa perceção. A ideia de satisfação de necessidades é a chave nesta argumentação. Principalmente a de criação de novas necessidades. Antes de termos telemóveis não sabíamos o que seria ter um. Portanto, ainda não readequamos as nossas vivências diárias a um produto que ainda não experimentamos e para o qual ainda não compreendemos que necessidades (que ainda não temos) irão ser satisfeitas.

Até eu, amante de suportes que armazenam conteúdos musicais e audiovisuais, acabei por me render aos serviços de streaming.

Bom, toda esta conversa para vos dizer que com o marketing certo e com a adesão de instituições públicas e privadas de grande abrangência na sociedade, haverá o antes e o depois neste campo da Realidade Aumentada. Nessa altura, as 24 horas que compõem os nossos dias serão reconfiguradas por estes óculos "smartificados", tal como já acontece com os smartphones e os tablets.

Apple Glasses | Fonte: Martin Hajek in tomsguide.com
Apple Glasses | Fonte: Martin Hajek in tomsguide.com

Nada contra, mas vou achar muito estranho percecionar a realidade sem tudo o que os óculos me irão permitir ver e fazer. É como ter o capacete do Homem de Ferro num contexto doméstico. Mas lembrem-se que o próprio Tony Stark só usava a armadura quando era realmente necessário. O resto era falado para o relógio ou computador equipados com a Super-Siri, vulgo Jarvis.

A Siri já anda connosco onde quer que estejamos, omnipresente através de todos os dispositivos que configuram o ecossitema Apple. A Google faz o mesmo. E, acaso estes óculos sejam efetivamente a nova grande aposta de Tim Cook, assistiremos a mais um quadrado na imagem que se segue. Ou mais, se vier o Apple Car (bom, de facto falta ali na secção do suporte o CarPlay).

A omnipresença da SiriA omnipresença da Siri nas nossas vidas
A omnipresença da Siri nas nossas vidas

Não vou entrar em paranoias a la Skynet do já extenso franchise cinematográfico Terminator. Se as máquinas vão tomar o poder e exterminar ou escravizar a raça humana? Não sei.

Mas que o nosso modus vivendi, hábitos diários, práticas culturais (enquanto povo) foram, estão e continuarão a ser fortemente moldadas pela inovação tecnológica, disso não tenho dúvida. Lembrem-se: a tecnologia não são os computadores. Tecnologia é por exemplo a invenção da roda e todas as implicações que se fazem sentir ainda hoje.

É, portanto, quase impossível resistir a esta mudança de paradigma. A longo prazo tudo estará normalizado. Se cá estivermos, muito velhinhos, poderemos avaliar se o saldo terá sido positivo por entre os músculos atrofiados resultantes de longos períodos deitados, tal como acontece no filme Surrogates, protagonizado por Bruce Willis.

Vá... não quero ser pessimista. Porque entusiasmante, lá isso é.

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